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| | EDITORIALEditorialLetter from the editors
Vivemos em tempos de “eclipse da verdade”, expostos a desmandos na esfera da política, diante dos quais os conceitos de liberdade, justiça e moral parecem se diluir na lógica da sociedade do espetáculo e do consumo.
Os últimos acontecimentos em nosso país, resultantes do enfraquecimento das instituições que deveriam tanto simbolizar quanto zelar pelo cumprimento da lei, falam-nos de uma falência do pacto social que permite abusos de toda ordem.
Assistimos a este espetáculo de forma desanimada, abafando indignação e revolta, expostos a uma retórica vazia e repetitiva veiculada pela mídia.
Embora não tenha surgido como proposta ética, a descoberta do inconsciente por Freud trouxe à tona uma série de questões, nada apaziguadoras, acerca das relações dos membros da cultura com o Bem, a Moral e a Ética. Revela que, no fundo, somos todos infantis e bárbaros.
Quando a lei se torna um artifício a serviço da farsa para encobrir atos perversos, a tarefa do psicanalista, como nos diz Maria Rita Kehl, nossa entrevistada deste número, não é do explicador, mas do indagador que convoca a palavra a trabalhar, até mesmo no campo do social.
É dessa perspectiva que alguns artigos deste número, que abordam temas como o sonho, o ambiente da música eletrônica e a fotografi a, reafi rmam a linguagem como saída para o mal-estar: escrevemos, sonhamos, narramos, comunicamonos para não morrer.
Substituindo o sexo, aliás, a morte tornou- se o principal interdito do mundo moderno. Fugir dela é uma das grandes tentações do Ocidente. Numa cultura que gira em torno de um individualismo exacerbado e hedonista, a morte coletiviza a miséria humana e confronta os sujeitos com seus limites. Fixar a morte pelas fotografi as, muitas vezes transgressivas, entrelaçando morte e vida, fugindo de um encolhimento produzido pelos mecanismos de defesa, fotografar é um modo de transformar a vida para que possa ser… vivida.
Assim, lemos que a experiência fílmica é uma abertura para um mundo possível onde o espectador pode experimentar-se imerso em um devir, que o ambiente das raves também possibilita, pelo encontro dos corpos, pelo ritmo da música, pela cadência do som, pelo embalo sonoro, a criação de um espaço lúdico, de devaneio. Longe de ser o lugar da alienação, podem signifi car o lugar do sonho compartilhado.
Refazendo a trama simbólica, o pensamento psicanalítico é convocado a re-tecer o fi o da história, remetendo-nos continuamente à dimensão de seres da cultura.
A Psicanálise não explica por que não almeja verdades absolutas mas pode oferecer, por meio da clínica, saídas éticas possíveis ao reconectar o humano com sua condição de sujeito habitado pelo inconsciente, não senhor do mundo, cuja única liberdade é a consciência da determinação, destinado a reconstruir sua própria signifi cação através dos sonhos, da fotografi a, da música…
As resenhas também nos convidam a este pensar ético-estético-psicanalítico e, a seu modo, contemplando concepções próprias de cada autor, apresentam uma variedade de novos livros que constituem um rico espaço de reflexão.
Boa Leitura!
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